terça-feira, 1 de setembro de 2009

O SUCANEIRO E O BOIOLA LADRÃO


1997. Equipe de leishmaniose em Angra para atividade de.

            Acostumados com outras viagens, não víamos à hora de tomar um banho gostoso no hotel quatro estrelas que nos hospedava sempre. Café da manhã, almoço de rei, piscina, tv a cabo. Mordomias que nos fazia sentir como pinto no lixo. Ha! Que beleza! A disputa foi acirrada para ver quem ia nesta viagem. Feliz foi quem ficou de fora.
             Primeira decepção:
1-      Não tinha reserva no hotel agendado para nós. Babou!
2-      O secretário de saúde não estava no município. Babou de novo!
3-      Ninguém levou mantimentos e estávamos com muita fome. Outra vez babou!
4-      Não tínhamos dinheiro porque contávamos com o hotel. Hô miserê danado!
5-      Já era tarde e o tempo estava passando e nada se resolvia.

Um sucaneiro pergunta:
_Vamos dormir na rua?
          Já estávamos com vergonha, pois os materias de uma das viatura que retornou estavam na rua. Mudamos de reis que almoçam em hotel de luxo, para favelados sem teto.
          No final da tarde, já anoitecendo, um responsável da secretaria de saúde, nos encaminhou para um alojamento na casa da cultura em frente ao cais do porto de angra. -Melhor isso do que em baixo da ponte! Reclamou um estressado cheio de fome.
          Acomodados no alojamento. Veio a pergunta que não queria calar:
 -Comer o que? Beber o que? Trabalhar como?  Uma saraivada de palavrões para desestressar dominou a todos.
 _ Esses caras pensam que somos o que? Peão de obra, escravos? Viemos aqui para trabalhar!
          Um perturbado da cabeça lembra ao reclamante.
_ Hô infeliz! Você falou que veio só para passear lembra? Que estória é essa de trabalho? A turma concorda e quase baixam o cacete no pobre coitado que tinha sido posto pela chefia sem nunca ter trabalhado na equipe.
_Calado senão apanha. Falou um revoltado.
          Um boca nervosa alcoólatra já não aguentava mais ficar sem dar uma talagada e disse que ia ao caixa eletrônico ver se tinha dinheiro da diária que recebíamos pelas viagens. Voltou rindo e pulando e já com um bafo que derrubava até elefante.
_Hu! Hu! Saiu, saiu tem dimdim, na conta tem dimdim!
Desespero total. Homens famintos e doidos pra curtir a noite se arrumando e partindo para o banco a busca do tão bendito dinheirinho. Salvos pelo gongo! Aos 45 do segundo tempo.
          Ao voltar para o alojamento, nos alimentamos em uma lanchonete. Um amigo do alcoólatra pergunta:
_Cadê o narigudo pé de cana?
 Um não muito amigo responde:
_ Deve ta gastando a grana com caninha da roça.
Dito e feito. No caminho, encontramos o dito cujo num boteco de cais do porto rodeado de gente mal encarada e já com amizade com o bebum cheios de más intenções.

          Chamamos o tal para dormir e ele já falando inglês, porque ninguém entendia nada, não quis vir. Voltamos ao alojamento que ficava no segundo andar, com uma sacada para o píer, onde na madrugada se via de tudo. Prostitutas, veados, maconheiros, tudo de ruim que se pode imaginar.

          Sem sono, a equipe resolveu acompanhar as investidas dos indivíduos da noite. Vimos mulher apanhando, casais de namorados transando e vimos também pessoas conversando à beira do píer. Não fazíamos idéia de onde estava o bebum.
          Lá pelas tantas, depois de tantas gargalhadas dos fatos presenciados, percebemos  um par de homens, ao longe, que conversavam sentados à beira do cais, tinham comportamentos estranhos, com mãos sobre os ombros, mãos sobre a cintura, mãos sobre aquilo, aquilo sobre as mãos e sacramentamos:
_São dois veadinhos safados, cara de pau, sem vergonhas. Esbravejou o intruso da equipe.
_ Que nojo! Disse ele.
Beijos ardentes dos amantes e todos a contemplar  aquilo tudo para nosso relex. Só faltava o rala e rola. Mas ali não dava né?
Então se levantaram os pombinhos e caminharam calmamente em direção ao alojamento.
O responsável do grupo adverte:
_Parem de rir!
Esses caras brigam de navalha e gilhete. Vai dar merda! Parem de rir! Parem!
Um sucaneiro com visão de raios-X, repara assombrado, sem acreditar no que via chegar próximo a nós. Cheio de nojo proclama:
_Essa não! É o narigudo pé de cana, é o narigudo!
O amigo do ébrio defende:
_ Pô! Não esculacha! O cara é casado. Não é ele não.
_É sim, olha só a roupa, o andar. Minha visão não me engana.
Silêncio de toda a turma e máxima concentração. Todos focados e céticos. Olhares fixos, atentos para os dois, quando derrepente um coro se ouviu:
_ ESSA NÃOOOOOO! E ele mesmo!
Cuspidas pelo chão, vontade de vomitar, gargalhadas. Loucura total.
Um sucaneiro reage:
_ Ele ta fora de si de tanta cachaça que tomou. Vamos descer e salva-lo senão será roubado!
A turma desce, e para surpresa de todos, ele estava bebado, mas não fora de si. Até apresentou a namorada, ou seja, o namorado.
_ Prazer, meu nome é...
_ Some daqui seu veado! Vaza! Vaza!
_ Uuuui! To indo bofe, to indo!
Nem deixaram o traveco completar o nome.Pegaram o narigudo pelo braço e o arrastaram para dentro. Mas antes lhe perguntaram:
_ Cadê sua carteira de dinheiro?
_ Ta no meu bolso. Respondeu quase quebrando a língua.
O amigo confirmou tocando no bolso e disse:
_ Ta aqui. Agora vamos dormir.

           No dia seguinte, ainda sorvendo e curtindo a maldita tubaína, o pegador de traveco acorda raivoso, procurando a carteira para começar o desjejum com um teco de cana e não acha.
O amigo diz:
_Ta no seu bolso de traz da calça.
O bebum discorda:
_ Isso aqui é meu maço de cigarros! Cadê o meu dinheiro? Eu vou matar um heim!
O não muito amigo às gargalhadas, ironiza:
_ Pergunta pro teu namorado de ontem à noite bem!
_ Quero meu dinheiro! Quero meu dinheiro! Reclamou até se convencer da merda que fez. Agora chora neném!
          O sucaneiro bebum ficou sem carteira, sem documento, com fome porque só bebeu, com um monte de chupão no pescoço, uma badolada no saco, um registro vergonhoso da historia e com uma cara de bunda que ninguém vai esquecer jamais. O Traveco? Deve ter adorado aquela bolada de dinheiro, como forma de pagamento pela sua noite de caricias e prazer e jogado os documentos no mar.

Trágico mas divertido não acha?






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